CANÇÃO DE QUEM SE FAZ AMANTE




De que me serve este amor
como uma chaga aberto ?
Na cidade de criaturas vazias
perdi a noção de mim
enegreci o cheiro do meu calor
enterrei o meu sexo
num buraco de excrementos sem raízes.
De que serve tudo isto
& a beleza que eu carrego
& as minhas palavras sinceras
& a luxúria dos meus gestos expostos ?
Caminho apenas
para evitar esses desencontros que se forjam
a minha espera em cada esquina
& se metem casa a dentro pregados
na minha roupa & pulando rutilantes na máquina.


Vou não sei por que abraçar a madrugada
pois as desesperanças me sacodem
por dentro como uma bolsa em que coração
& músculos sem peso estiram-se
& vibram num orgasmo masturbado.
Amar é apenas uma expressão vaga
na boca de quem me ouve.
Minhas correrias pelas ruas caladas
são buscas inúteis & eu me ofereço
eu me ofereço amigo & quente
tenho a carne toda para repartir
em cada instante & por mil atos
multiplicarei os meus pedaços.
Eu quero servir minha condição máscula
como quem espalha
sua febre & sua peste em torrentes
sobre os céus da cidade
& derrubar as árvores de solidão cimentadas
nos rostos que encontro.




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(do folheto UM DOIDO E A MALDIÇÃO DA LUCIDEZ,
edição do autor, Palmares, PE, 1975)

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